Algumas outras observações a respeito da Audiência Pública sobre falta de água em Trindade

O que a atual crise da falta de água deve provocar de mudanças nas famílias, empresas e até nos órgãos da Prefeitura…


Autoridades municipais na Audiência Pública. (Foto: Cristiano Vaz)



Pensando ainda mais um pouquinho a respeito da audiência pública sobre a falta de água em Trindade, realizada na segunda-feira (23), pela Câmara Municipal, consequência de uma interessante sugestão do vereador Weslley Cabeção (PMDB).

Sempre em evento do tipo, o público se cansa com as saudações repetidas dos políticos que ficam ali se elogiando mutuamente. A cada manifestação acontece uma enxurrada de adjetivos e agradecimentos que, lá pelo segundo orador, quem está na plateia já começa a bocejar. Desnecessário isso e os políticos deviam se tocar, priorizando a objetividade e o foco no assunto principal da audiência.

Agora, quanto a audiência em si ficou evidente que as empresas responsáveis pela captação, tratamento e distribuição de água (Saneago) e afastamento e tratamento do esgoto (BRK Ambiental) deram uma banana para a Câmara Municipal de Trindade, um gesto de desrespeito até com a população local que merece sim receber todas as informações relativas aos serviços contratados pelo poder público em nome dos cerca de 127 mil habitantes (estimativa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE – para 2017) da “Capital da Fé”.

Vale notar também que as autoridades municipais que se manifestaram na audiência pública se elogiaram tanto que ficou parecendo que, da parte da Prefeitura e de seus órgãos, nenhum reparo a fazer na atuação ao longo dos últimos anos, porque todo o problema da falta de água de hoje em dia seria única e exclusivamente consequência do “desinteresse” das empresas mencionadas acima. Será que é isso mesmo? Simples assim?

Particularmente, penso que algo não funcionou tão bem como esperado pelos cidadãos trindadenses, pois a crise da falta de água decorrente da drástica redução na vazão do Córrego Arrozal fez a Prefeitura de Trindade se movimentar e o pessoal saiu a campo para fiscalizar e viu empreendimentos consumindo água demais para regar hortaliças e gramas, além de outras formas de captações tudo isso sem a devida e necessária outorga, não raras vezes. Ou seja, quem devia estar muito atento à utilização deste recurso fundamental à vida de todos acabou surpreendido pela grave situação do momento.


E quanto ao esgoto, hein? Vídeo apresentado na audiência pública pelo vereador Weslley Cabeção é algo assustador. Esgoto bruto sendo jogado no leito do córrego que abastece os trindadenses, imagens de “detritos sólidos” (bosta mesmo, conforme disse o vereador) naquelas águas que, muito provavelmente, alguém de nós dela bebeu, com certeza. E o vídeo segue “bombando” nas redes sociais de trindadenses indignados com semelhante descaso com a saúde pública, diga-se de passagem, revelado por tão triste episódio. Sávio Fraga e Greco, representante do Ministério Público de Goiás (MPE-GO) em Trindade, participou da audiência e vias imagens estarrecedoras, é de se esperar alguma medida judicial quanto ao assunto.

Mas o que passou, passou, e a sabedoria popular ensina que “águas passadas não movem moinhos”. Andemos, pois. O que o poder público municipal pode ou deve tirar de lição disso tudo para daqui para frente? Sei lá, mas uma coisa arriscaria a dizer. É preciso que seja feita gestão da água, o que passa pelo maior cuidado e atenção com a conservação das nascentes e de todos os cursos d’água que existem no município. Atividade que deve fazer parte da rotina de trabalho mesmo e a população, o cidadão, deve estar atento a isso, vale salientar.

Outro ponto que faz pensar tem a ver com as corriqueiras autorizações para criações de novos loteamentos urbanos no município. Se a água anda assim tão escassa, como é que o poder público autoriza o lançamento de novos bairros na cidade com facilidade? E há inclusive empreendimentos na zona rural que, na propaganda, se fala na maravilha que será para o indivíduo que comprar aquele terreno poder contar com um “parque aquático no quintal de casa”. É importante também refletir a respeito dos loteamentos na zona rural, aquele no qual uma área é dividida em várias pequenas chácaras às margens de rios. Essas práticas convém que sejam melhor analisadas doravante. O meio ambiente agradece, principalmente a água nossa de todo dia.

Ah, sim! As famílias precisam mudar a forma de consumir água, evidentemente. As empresas também. O agronegócio, pela mesma forma. Ninguém pode se apoderar deste recurso para sua utilização como se estivesse diante de um direito divino e que todo o restante da população que se dane. Essa mudança de comportamento vale também para órgãos públicos. Quer um exemplo? Na quinta-feira (26) havia um caminhão pipa da Prefeitura jogando água na Avenida São Pedro, esquina coma a Rua da Saudade, em frente ao Cemitério Municipal, no Setor Santo Onofre. Que fosse água de lago, sem tratamento, mas era água e, nestes tempos atuais de sequidão, o exemplo melhor é evitar fazer uma coisas dessas. Até porque, “a palavra convence, mas o exemplo arrasta”…

E para finalizar essa notinha que ficou longa toda vida, da audiência pública em questão, faço questão de destacar trechos do pronunciamento do advogado Marcelino Assis Galindo, presidente da Subseção de Trindade da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), conforme a seguir:
“Falta de água está relacionada à falta de planejamento e investimentos. Planejamento para zelar pelos mananciais, pelos reservatórios; investimentos para aumentar os reservatórios com aproveitamento de outros leitos, pois só assim, planejando e investindo, não ficaremos à mercê do imponderável, das chuvas e da ação da natureza. Aliás, natureza, tão maltratada e desrespeitada, mas, sabemos, a natureza não age, mas reage e a reação é fulminante. E para suprir, agora, só nos resta remediar a situação, tentando conscientizar a população da insuficiência do recurso indispensável para a nossa sobrevivência. Priorizar o atendimento humano, fiscalizar os pontos de irrigação. E promover ações que evitem a repetição da situação atual. A fiscalização é necessária, o investimento é indispensável e o lucro, pode até ser um dos elementos, mas não pode ser o principal foco de uma empresa que se habilita a cuidar de tão vital e indispensável bem”.


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