O combate à intolerância religiosa é dever de todos: Há muito o que fazer para que todos tenham liberdade de culto

A luta contra a intolerância religiosa é um compromisso contínuo para assegurar que todos no Brasil possam exercer sua fé livremente



ARTIGO | Paulo Afonso Tavares é professor, historiador e jornalista. Cursa ainda doutorado em História na UFG e o mestrado em Desenvolvimento e Planejamento Territorial na PUC Goiás

No último dia 21 de janeiro (domingo), o Brasil celebrou o Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa, uma data simbolicamente importante que evidencia o compromisso do país com a liberdade de culto e a proteção aos que desejam professar sua fé. Instituído pela Lei n.º 11.635, de 27 de dezembro de 2007, este dia é uma homenagem à Mãe Gilda, fundadora do terreiro Ilê Axé Abassá de Ogum, em Salvador, que sofreu episódios de difamação e intolerância, levando à invasão de sua casa e terreiro por um grupo de outra religião, e faleceu em 21 de janeiro de 2000.

A Constituição Brasileira de 1988, em seu artigo 5º, inciso VI, estabelece a liberdade religiosa como um direito fundamental, assegurando que “é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias”. A proteção constitucional é um pilar na defesa da diversidade de crenças e na garantia do respeito mútuo entre diferentes religiões.

Mãe Gilda foi uma figura emblemática na luta contra a intolerância religiosa no Brasil. Iyalorixá Gildásia dos Santos e Santos, ela fundou o terreiro de Candomblé em 1988, próximo à Lagoa do Abaeté, em Salvador. Após sete anos de iniciação no Terreiro de Oya, recebeu o cargo de iyalorixá, destacando-se por sua forte personalidade e participação ativa na melhoria do bairro de Nova Brasília de Itapuã. Infelizmente, ela foi alvo de calúnias e agressões físicas e verbais, juntamente com seu marido, falecendo vítima de um infarto fulminante.

Os dados sobre intolerância religiosa no Brasil são alarmantes. Em 2023, foram registradas 2.124 violações de direitos humanos relacionadas à intolerância religiosa, um aumento de 80% em comparação com 1.184 violações em 2022, segundo informações do Disque 100 – Disque Direitos Humanos. As denúncias subiram de 898 em 2022 para 1.478 em 2023, representando um aumento de 64,59%. As religiões de matriz africana, como Umbanda e Candomblé, continuam sendo as mais afetadas, com São Paulo, Rio de Janeiro e Bahia liderando em número de casos.

O Disque 100 oferece um canal vital para a denúncia de violações de direitos humanos, incluindo casos de intolerância religiosa. O serviço, acessível por ligação gratuita para o número 100, WhatsApp (61) 99611-0100, Telegram (buscando "direitoshumanosbrasil"), e videochamada em Libras no site do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, é essencial para que as vítimas de intolerância religiosa possam buscar justiça e proteção.

O Brasil, como Estado laico, tem o dever de manter uma separação clara entre Estado e religião, assegurando a proteção ao livre exercício de todas as religiões. A intolerância religiosa é crime no país, e diversas leis asseguram a liberdade de culto e a proteção aos fiéis. Além do artigo 5º da Constituição, o Código Penal Brasileiro, em seu artigo 208, criminaliza atos de escárnio, perturbação e vilipêndio de práticas religiosas, com penas que incluem detenção ou multa, e aumento da pena se houver emprego de violência. A Lei nº 14.532/2023 adicionou um parágrafo ao artigo 140 do Código Penal, intensificando as punições para injúrias religiosas. O Estatuto da Igualdade Racial, em seu capítulo III, tem artigos dedicados à liberdade de consciência e crença, e a Lei 7.716/1989 define crimes resultantes de preconceito de raça ou cor, incluindo discriminação religiosa.

A luta contra a intolerância religiosa é um compromisso contínuo para assegurar que todos no Brasil possam exercer sua fé livremente. “Religião é, ou deveria ser, como sair para jantar com amigos. Mesmo que cada um peça um prato diferente, todos podem sentar à mesma mesa”. Este pensamento simboliza a harmonia e o respeito que devemos aspirar, celebrando a diversidade religiosa como uma parte valiosa de nossa sociedade.


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